Para driblar os problemas do transporte cheio, costumo sempre lutar para ficar pelo menos num lugar encostado e não ter muitos problemas com o equilíbrio, já que uma mão estará segurando o livro. Além disto, como tenho problemas de concentração num lugar onde as conversas paralelas são muitas e altas, sempre coloco trilhas sonoras para ouvir durante a leitura. Logo me transformo em um casulo, bem localizado pra não cair e imerso ao caos lateral com um metal no ouvido.
Quando cheguei próximo da Lapa, meio caminho da minha casa ao centro de São Paulo, uma grande quantidade de pessoas se adentrou ao vagão já lotado, gerando mais aperto. Mesmo imerso na minha leitura, algumas coisas não davam pra deixar de observar. No meio desta galera que entrou, veio uns 6 amigos em bloco que estavam juntos na confusão e ficaram bem no meio do vagão sem lugar pra se segurar. A cada balançada do trem eles eram jogados de um lado para o outro, inclusive para cima de mim. Eles não estavam nem ai, nem se davam ao trabalho de se segurar, até brincavam e conversavam entre si. Algumas vezes me incomodava, pois detesto gente que se escora e não tem preocupação com o desconforto que pode estar gerando no outro.
Mas eu continuava no meu casulo. Estou lendo o livro “Não se Desespere”, do Mário Sérgio Cortella, que é uma junção de diversos pensamentos filosóficos sobre nosso modo de vida. Uma moça, no meio deste grupo chegou a dar uma olhadinha de canto de olho e deu um pequeno sorriso. Percebi que ela estava lendo a capa do livro e tentando decifrar sobre o que ele falava. Eu mesmo faço isto várias vezes na vida. Adoro ver o que as pessoas estão lendo e tentar decifrar do que o livro fala. Um título não resume o assunto de um livro. “O caçador de Pipas” não é a história de um cara que fica empinando uma pipa no céu, é uma coisa muito mais complexa que isto. “Anjos e Demônios” não fala sobre anjos e nem demônios. Mas muita gente lê o título e acha que sabe o que ele se trata. É curioso ver as pessoas lendo o título do seu livro, pois penso no que eles devem estar pensando. Ela deve ter pensado que eu queria me jogar do décimo andar e resolvi ler o livro “Não se desespere!” pra tentar me acalmar.
Enfim. Estava eu concentrado em minha leitura quando uma música acabou e no intervalo de uma para a outra fica um silencio de alguns segundos. Neste intervalo eu ouço o que o povão está falando e gritando. Neste momento o trem deu uma chacoalhada e um cara gritou para os outros: “gente, não se desespere, não se desespere!”. Deu uma vontade de dar risada. Obviamente eles chegaram a comentar sobre a capa do livro e adaptaram na situação de merda na qual nos encontrávamos. Não tinha muito a ver com o livro, mas o uso do título naquele momento não poderia ser mais perfeito. Eu era o assunto do trem e nem estava sabendo.
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